Gosto muito do início das “Desventuras em Série”, de Lemony Snicket, pseudônimo de Daniel Handler, pelo o fato de que eu, que não perdi os meus pais, realmente não saber o que sentiram as crianças Baudelaire quando perderam os delas, dando início à sucessão de coisas ruins nessa história. Quando dizemos “entendo” diante do sofrimento ou alegria de alguém, fazemos isso por educação, por gostarmos de quem nos fala ou por associação com um sofrimento ou alegria que tivemos e que julgamos parecidos com o experimentado pelo outro. Entretanto, nunca sinto o que o outro sentiu, apenas me alegro ou sofro “indiretamente”. Uma pessoa empática se alegra com o casamento de um amigo, mas ainda acho que uma pessoa, por mais empática que seja, não deixaria de se casar por achar que a alegria de ver seus amigos se casando já é suficiente.
Algo semelhante acontece quando tentamos explicar a alguém o que é ABUB. Sempre escutamos um “entendo” um tanto chocho, pois tentamos usar coisas que ela conhece para explicar o que ela não conhece, como quando, diante da dificuldade de fazer o outro entender o gosto de algo, dizemos: “tem gosto de frango”. É necessário ser da ABUB para saber o que significa ABUB. Para aprender a nadar, como nos ensinou Ziel, é necessário nadar.
Atas são muitos ruins para se entender o que significa ser da ABUB, pois se limitam a dizer que Aracaju propôs tal coisa, Recife apoiou e o plenário aprovou. Atas nunca dirão coisas do tipo:
Acordamos com uma linda manhã de sol em Salvador. As baianas estão mais bonitas do que nunca. A ABU-Love está agindo, apesar dos vacilos do sacrossanto Sinédrio. Felippe Schmitt, como de costume, passou o café fazendo brincadeiras, entre elas, divertindo os novatos em CR com a famosíssima partida de futebol entre Antigo Testamento e Novo Testamento. Depois de bem alimentados com a culinária nordestina e satisfeitos de tanto rir com as piadas dos cearenses tivemos um momento devocional, em que o nosso Obreiro, Felippe, fez uma excelente exposição bíblica. Felipe muito tem abençoado a região com seu esmero em expor e explicar o que o texto diz, fazendo um trabalho como poucos fazem hoje em dia. Dudu Baiano, como já deixa claro o seu nome de guerra, dirigiu a plenária com a voz de dormir em rede. Foi unânime a idéia de que o Senhor está agindo...
Mesmo os vídeos de CF, IPL ou qualquer outro evento são insuficientes para dizer o que é ABUB, o que são as deliciosas conversas, as transformações no caminhar, as coisas que Deus falou secretamente aos corações durante uma oração ou uma exposição. O que foi conversado numa Agenda Interior permanecerá interior para sempre.
Não cabem em textos, vídeos ou mesmo em conversas o que se passa no coração de alguém antes da parte prática em um IPL. Todo mundo fala em “zona de conforto”; deixá-la “são outros 500”. A parte prática do IPL é extremamente perigosa uma vez que a parte prática não nos devolve quem enviamos, mas nos manda outras pessoas, completamente diferentes daquelas a quem enviamos.
As palavras, coitadas, não dão conta de dizer o que os olhos dizem ao coração quando vêem um ente querido de outra região. A ABU-love, ministério muito forte no Nordeste, não entra em vídeos, atas e relatórios, mas entra nas orações, nos sorrisos e, principalmente, nos corações. Como descrever o cheiro de uma menina conhecida na ABU? Como descrever o que é dar um chêro para quem não é da ABU-NE? A serenata é um mistério, mais do que um ministério. Elas sempre sabem que vão ganhar, eles sempre fingem que não vão dar. Mas, no final, é sempre uma surpresa. Elas provam o que Quintana nos ensinou, ao afirmar que Nada convém que se repita.../Só em linguagem amorosa agrada/A mesma coisa cem mil vezes dita. (Mário Quintana). Não tente entender, coloque sua cabeça na janela e olhe para aquele menino do Rio Grande do Norte, ou coloque força na garganta e cante para a menina da Paraíba.
No momento silencioso, Deus fala coisas que jamais se repetirão, mas que marcarão para sempre. Parafraseando Rubem Alves, eu diria que "Bom psicanalista é o silêncio reflexivo, sem nada cobrar, pelos sonhos de amor que nos faz sonhar".
E a Ceia na ABUB? Para mim, e sei que para muitos, é um dos momentos mais emocionantes da vida. Como é bom saber e cantar que “Cristo está presente aqui/Neste celebrar!”. Como é bom saber que “Quem serve o vinho e parte o pão/É o próprio Cristo ressurreto e nosso irmão”, que “O Rei da terra e céus é nosso anfitrião,/[que] Com vinho e pão nós celebramos comunhão.” Aí se unem a saudade e a esperança, pois, ao mesmo tempo em que celebramos, em memória, a morte dAquele que está presente, vivinho da silva, na celebração de sua própria morte já choramos pelos amigos presentes que irão embora para suas respectivas cidades.
Só quem viveu essas coisas pode dizer um verdadeiro “entendo”. Qualquer outro apenas está usando coisas que conhece para falar de coisas sobre as quais não faz nem idéia. No entanto, precisamos chamar as pessoas lá de fora para cá. Acho que quando formos convidar alguém, devemos nos imaginar como avós contando histórias para netinhos, pois esses são os relatos que mais se aproximarão do que é ABUB, ou seja, as histórias de quando estivermos pós-graduados em saudade e com livre-docência em esperança, tornando presentes os ausentes, fazendo o tempo se ajoelhar ante a eternidade. Nossas histórias, embora saudosas, apontarão para frente, pois nos lembrarão que cantamos, entre choros, orações e abraços, que nós “logo vamos nos reunir/No grande encontro preparado que há de vir!/Na glória do Senhor,/Em todo o esplendor. Com amor, fé e esperança nós celebramos comunhão".
Flávio Américo
ABU Natal (RN) / Campinas (SP)
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